Perguntam-me: és um religioso?
Respondo: sou.
Por que teus textos falam pouco de Deus?
Não creio que Deus esteja ausente nos meus escritos.
Talvez de modo diferente, mas está muito presente.
Tudo que é humano, é divino.
Prefiro falar de minhas experiências de homem, varão,
nas minhas alegrias e dores,
virtudes e vícios,covardias e heroísmos,
saúde e doenças,abstinências e prazeres.
Bruto e sensível.
Sou assim, contraditório. Sempre.
Na contra-mão da vida, sinto a transcedência.
Pedem-me: seja mais recatado.
Não tenho mais idade para isso!
Indagam: amas alguém?
Pergunto, eu: é possível ser amado, sem amar?
Homem ou mulher?
Importa? Homo ou hétero não é a questão.
Pra mim, é: somos capazes de nos humanizar?
Sofrer com os que sofrem,
emocionarmo-nos com uma rosa ou a chuva,
sentir uma criança, construir jardins,
fazer discursos, apreciar boa comida.
Lutar com os vulneráveis da sociedade.
Chorar em casamento ou enterro.
Ou mesmo num filme bobo.
Ter dor de barriga diante de pessoas dormindo na rua Araújo.
E correr para o metrô, tentando esquecer.
Já disse, sou covarde. E também medroso.
Há gays e não gays bloqueados na sua humanidade.
Católico, metodista, presbiteriano, mulçumano, ateu...
Experimento Deus na tradição religiosa católica,
é um presente que recebi dos meus antepassados.
Está no meu dna.
Mas não acredito que é o único jeito de amar a Deus.
Nem o mais complento; nem é o mais deficitário.
Amo a missa, Nossa Senhora e confesso-me.
Rezo os salmos quase todos os dias.
Jesus não foi católico, foi judeu na religião.
O importante é amá-lo de todo o coração,
com toda a mente, com todo o meu/nosso ser.
Tenho fé, não certezas.
Tenho esperança, não verdades.
Sou isto e não sou ao mesmo tempo.
A inconstância também me explica,
mas não me define.
O que Deus quer de mim?
Não sei.
No escuro, procuro descobrir.
Tenho receio em partilhar isto,
mas partilho.